Perto da meia noite eu lá passava: era um porto sombrio, desolador. Eu caminhava, introspecto como sempre, enquanto a névoa acentuava a dor. A dor de querer ter um objetivo, mas quando tê-lo não cumpri-lo ao todo. Faltava a garra de querer o mundo! Era esse spleen que eu tanto detestava. E eu, tão sozinho quanto o porto imundo, me confundia, talvez, co’essa névoa. Meu coração soltava um grito agudo. De dor?, de angústa?, medo? Que seria?
Tão de repente, nessa névoa fria, um marinheiro apareceu do nada. Cambaleando em seu tão ébrio estado, esbarrou em minha pessoa e foi ao chão. De olhar vidrado, a cara apavorada, fez-me terror ao fundo de minh’alma. Eu quis correr, mas o espectro maldito pegou-me a perna, meu Deus!, que faço?
Então, co’aquela cara de fantasma, ele me deu novo sentido à vida.
Ele disse:
“Navegar é preciso. Viver não é preciso!”
E morreu.

Eu, Fernando e a Vida

Festejai! Que na vida nada mais é preciso
Que um coração batendo e sangue nas veias!
À vida de qualquer um, a qualquer vida simples
Basta o pulsar de vida e a sensação das coisas.
Bata, coração, que basta a qualquer vida!

À vida de qualquer um, não à minha.
De modo algum à minha.

Navegar é preciso,
Viver não é preciso.

Há uma fascinação do ser humano pela leitura desde tempos remotos.  Por algum motivo, começou-se a escrever por prazer, para que alguém lesse o escrito com o mesmo prazer. Por quê? Acho que acima das questões metafísicas e existenciais está essa pergunta. Não há motivo racional para tal fato ter acontecido, ainda sim aconteceu. Nada é mais supérfluo que literatura, pois arte nada mais é que contemplação do trabalho de outra pessoa. A arte não alimenta, a arte não salva vidas, a arte não faz nada. É implausível, ao menos para mim, por que a arte é tão bela. Não entendo, e talvez jamais entenderei, por que nasci fascinado por algo que, por si só não é de maior valia.

Por mais que eu tenha total consciência da inutilidade que é a arte, sinto-me, ocasionalmente, impelido a buscar na arte um sentido maior, algo de humano, algo de realmente belo. Encontro! Encontro ainda mais do que procurava, uma vez que procurava um motivo para a arte e achei uma arte para um motivo: toda a forma de arte é, nada mais nada menos, que um espelho da alma humana. Há, claro, aqueles que pintam na tela do espelho uma imagem falsa, borrada, errônea, mas, felizmente, a arte real é bela e pura, mesmo sendo distorcida. Por ser sincera é tão bela a arte realista, a romântica, a moderna e tantas outras fascinantes formas de expressão.

Eis que encontro coisas ainda mais belas: fatos ainda naos revelados, segredos, mistérios ou, se quiserem, livros.
Escrevo todo este texto apenas para demonstrar o meu apreço pelas obras que achei em minha casa e que ainda não tive a oportunidade de ler, mas que logo logo estarei lendo. Entre elas constam livros de poesia do maior poeta que conheço (Pessoa), um livro de reflexões de Jean-Paul Sartre, A Arte da Guerra, fábulas de La Fontaine e, de longe, o que mais me intriga: A Odisséia, de Homero. Intriga-me tal livro por ele ser o centro das dúvidas expostas no começo de meu ensaio, ou melhor traduzindo: Por que o ser humano começou a escrever artisticamente? Homero sabia que talvez fosse lido por mais pessoas que não apenas os gregos? Quem inventou o conceito de arte? Quando? São fatos que talvez jamais sejam elucidados e, talvez por isso, são os mistérios mais fascinantes de toda a história.

Inédito

Pode vir a ser inédito a uma pedra
Ter sentimentos, tais quais a felicidade,
A tristeza, a solidão, a amargura,
O contentamento, o conforto, o medo.

Para uma pedra…. Para uma pedra!
Por que não sou eu uma pedra?
Ser pedra seria tão mais fácil!
Tão melhor! Ah! Eu quero ser pedra.

Eu quero ter a metafísica das árvores,
Como me disse o mestre eterno.
Eu não quero suportar meus dilemas fúteis.
Fúteis até o que se pode imaginar.

Não somos, na condição de seres vivos,
Adaptados a mudanças bruscas, surpresas.
Dá-nos medo o que nos é inaudito.
Por que haveria de ser diferente?

Resta-nos driblar a incerteza, a surpresa.
Resta-nos o que nos resta, isso basta.
Não pensemos, que nossa mente não o sabe fazer!

Há mais coisas entre o céu e a Terra, Horácio,
Que sonha toda e qualquer filosofia.

Assim sempre foi e assim sempre o será.
Contentemo-nos.

Porque antes que indaguem (gosto de me antepôr), toda e qualquer forma de arte tem sua influência particular.

Acontece que o egoísmo é a expressão sincera da alma de tudo, sem a capa de falsidade e de regras morais que tudo nos impõe, talvez uma possível influência de nosso amigo cadáver, Brás Cubas?

Acredito já ter citado outro ídolo meu, Fernando Pessoa, em meu texto de inauguração, pois sobre ele poso versar acerca de sua influência vital em minha obra. Observando as pífias composições de minha pessoa, pude ver a influência mais que nítida da figura de Álvaro de Campos fluindo sem o menor esforço. Pessoa consegue me prender a atenção de uma forma mística.
Acho que em algum momento da minha vida sofri forte influência determinista de Aluísio de Azevedo, naturalista nato.
Mas não direi que me filio apenas aos grandes autores de antigamente.
Sofri notada influência modernista, especialmente de sua vertente iconoclasta e sarcástica, das quais gosto muito.
Notei, também, em minhas composições, uma grande semelhança temática com um cantor o qual admiro muito: Jorge Drexler. Não que eu verse da mesma forma que ele ou componha músicas, mas os temas atuais são pontuais em sua obra, o que causou uma imediata identificação por minha parte.

E mesmo tendo tantos ídolos literários (ou não), eu prefiro pensar com quem não me identifico, para fugir dos vícios da mediocridade atual.
E quando me refiro à mediocridade, generalizo, pois não há, quase, produção artística realmente boa e de fácil acesso. As hordas de massa de manobra se multiplicam, hoje com menos intensidade, mas não deixam de ser o despojo cultural para quem os grandes “artistas” voltam suas obras que carecem de maior profundidade.
É o “Panis Et Circensis”, o que não me incomoda: é melhor ser um culto em meio a muitos incultos que mais um culto em meio a outros semelhantes, ao menos para o ego.

E chega de versar por hoje, já sabem o quero dizer com “Egoísmo” e também quais as minhas motivações. É hora de convencê-los de meus pontos de vista.