Aparência
(Analogia)

Tem umas cicatrizes estranhas em meu corpo.
Seria fácil demais fazer uma analogia
Entre as minhas cicatrizes misteriosas
E as tantas que já se formaram fora da minha vista.

Seria fácil, portanto dispensável.
Afinal de contas, que posso falar eu das injustiças
Que não vi nem vivi, nem ao menos me importei até hoje?
Como poderia eu ser tão hipócrita?

Ao mesmo tempo poderia eu fazer uma analogia vã
Entre as minhas cicatrizes limpas e misteriosas
e outras tantas coisas fascinantemente obscuras.
Quiçá até mesmo marcas de glórias passadas!

Vim, vi, venci e ganhei tais cicatrizes!
Mentira! Mais mentira que todas as mentiras juntas.
Mas não seria uma mentira óbvia,
Apenas um recurso poético?

Por que não associar minhas cicatrizes burguesas
À dor dos amores que se foram, que me esqueceram?
Por que diabos fazer tal lixo?
Nego-me a entender tal “dor” tão enfadonha.

Essas cicatrizes são, sim, marca de autonomia:
Nada mais, nada menos, nem nada especial.
Representam eu, apenas eu, minhas marcas.
Marcas d’água da minha pessoa, em minhas costas.

Que fácil é fazer analogias vagas, feias, pobres.
Analogias dementes, burguesas, adolescentes.
E como se fosse eu um equilibrista bêbado
Fujo covardemente de tais comparações.

Porque antes que indaguem (gosto de me antepôr), toda e qualquer forma de arte tem sua influência particular.

Acontece que o egoísmo é a expressão sincera da alma de tudo, sem a capa de falsidade e de regras morais que tudo nos impõe, talvez uma possível influência de nosso amigo cadáver, Brás Cubas?

Acredito já ter citado outro ídolo meu, Fernando Pessoa, em meu texto de inauguração, pois sobre ele poso versar acerca de sua influência vital em minha obra. Observando as pífias composições de minha pessoa, pude ver a influência mais que nítida da figura de Álvaro de Campos fluindo sem o menor esforço. Pessoa consegue me prender a atenção de uma forma mística.
Acho que em algum momento da minha vida sofri forte influência determinista de Aluísio de Azevedo, naturalista nato.
Mas não direi que me filio apenas aos grandes autores de antigamente.
Sofri notada influência modernista, especialmente de sua vertente iconoclasta e sarcástica, das quais gosto muito.
Notei, também, em minhas composições, uma grande semelhança temática com um cantor o qual admiro muito: Jorge Drexler. Não que eu verse da mesma forma que ele ou componha músicas, mas os temas atuais são pontuais em sua obra, o que causou uma imediata identificação por minha parte.

E mesmo tendo tantos ídolos literários (ou não), eu prefiro pensar com quem não me identifico, para fugir dos vícios da mediocridade atual.
E quando me refiro à mediocridade, generalizo, pois não há, quase, produção artística realmente boa e de fácil acesso. As hordas de massa de manobra se multiplicam, hoje com menos intensidade, mas não deixam de ser o despojo cultural para quem os grandes “artistas” voltam suas obras que carecem de maior profundidade.
É o “Panis Et Circensis”, o que não me incomoda: é melhor ser um culto em meio a muitos incultos que mais um culto em meio a outros semelhantes, ao menos para o ego.

E chega de versar por hoje, já sabem o quero dizer com “Egoísmo” e também quais as minhas motivações. É hora de convencê-los de meus pontos de vista.